terça-feira, 20 de janeiro de 2015

Escolas cervejeiras

Quando vamos falar nas origens das cervejas de qualidade obrigatoriamente precisamos passar pelas principais "escolas cervejeiras", que são na verdade países que desenvolveram características específicas em suas cervejas. Essas características vão de variedades de insumos locais (especiarias, frutas, variedades locais de lúpulos, leveduras) e até mesmo eventos e Lei que define os ingredientes.

Hoje podemos destacar 4 principais escolas cervejeiras:

A escola Alemã, onde através da Lei da Pureza de 1516 (Reinheitsgebot) ficou determinado que só se poderia produzir cerveja com 3 ingredientes (água, malte e lúpulo) na época ainda não se dominava o processo de fermentação, posteriormente foi incluído a Levedura como ingrediente permitido.
Vigente até os dias de hoje, apenas 16 anos mais nova que o descobrimento do Brasil, a Lei de Pureza alemã constitui um dos mais antigos decretos alimentares da Europa.
Essa talvez seja a escola mais seguida pelas micro cervejarias artesanais, é fácil encontrar cervejas que estampam com orgulho no rótulo "Produzida de acordo com a Lei de Pureza da Alemanha". O que nem sempre é sinônimo de qualidade, mas a chance da cerveja ser ruim é muito pequena.
Quando algum amigo que esta querendo conhecer cerveja além das comerciais e me pergunta quais comprar eu sempre recomendo começar por alguma puro malte, que siga a Lei de Pureza.
Por ser aceito apenas os 4 ingredientes básicos na produção, é uma escola muito rígida. Os alemães tiveram que desenvolver inúmeras técnicas e muita pesquisa em cima da cerveja, insumos tecnologia nos equipamentos para fazer cervejas fantásticas com diferentes variedades, sabores, aromas, cores e características com apenas os quatro ingredientes permitidos.
Uma característica muito legal da Alemanha é que cada cidade tem sua cervejaria, por menor que seja, sempre tem uma cervejaria local, isso quando não é mais que uma e até dezenas. É um povo defende e apoia as cervejarias locais, entende, gostam e consomem muita cerveja, celebram a cerveja diariamente nos biergartens e a maior festa cervejeira do mundo é alemã, a Oktoberfest.
Se fizer uma pesquisa no Google de imagens para a palavra "Alemão" aparece o alemão de traje típico tomando cerveja.
Podemos citar como clássicos dessa escola os estilos German Pils, Bohemia Pils, Helles, Weizen, Kölsch



A Escola Inglesa se caracteriza por ser muito difundido as cervejas de Alta Fermentação (Ale), são cervejas mais complexas, mais amargas, secas e costumam ser menos carbonatadas e bem mais alcoólicas.
A escola é tão antiga quanto a alemã, porém passou por grandes mudanças. Antes do século VX  as cervejas eram doce, forte e muito alcoólicas, uma herança do hidromel, que era a bebida mais popular nas Ilhas Britânicas na idade média e passaram a tomar cerveja. A partir do século XV vem a segunda grande mudança: Passaram a utilizar o lúpulo nas cervejas, que deixaram de ser doce e passam a ser cada vez mais amargas.
No século XVI começa o desenvolvimento de colonias inglesas pelo mundo, a cerveja era levada em navios e precisava resistir por longo tempo em barris nas viagens, num tempo onde não havia refrigeração. A solução era colocar grande quantidade de lúpulo na cerveja, que por ser um conservante natural garantia a qualidade da bebida durante as longas cruzadas marítimas.
Oficiais do Exército Britânico que residiam na Índia durante o período colonial eram abastecidos com essas cervejas, assim nascia o estilo India Pale Ale.
Na segunda metade do século XX as grandes cervejarias e suas Lagers começaram a dominar o mercado com cerveja barata. Pequenas cervejarias começaram a fechar e até estilos tradicionais estavam desaparecendo. Surge então um movimento de consumidores, liderado por 4 amigos que, revoltados com a falta de qualidade das cervejas criam o Campaing for Real Ale CAMRA (Campanha pela Ale de verdade). Um movimento que rapidamente conseguiu milhares de adeptos, com muita pressão politica, boicote a cervejarias e pubs que haviam abandonado as Ale tradicionais e através de pressão conseguiram do governo incentivos fiscais aos produtores artesanais e conseguiram mudar o cenário cervejeiro.
O CAMRA é considerado o movimento de consumidores mais bem sucedido na Europa e hoje conta com mais de 150.000 membros em todo o mundo. Fomentam a cultura cervejeira através de eventos, concursos cervejeiros, certificação para pubs e cervejarias, dentre outras ações.
Como estilos da escola podemos citar a Stout, Porter, India Pale Ale, Barley Wine, Brown Ale.



A Escola Belga, talvez seja o berço dos cervejeiros mais criativos.
Considerada por muitos o paraíso das cervejas.
São dezenas de estilos próprios e a utilização de inúmeras especiarias na cerveja, como por exemplo o coentro e cascas de laranja na WitBier. Utilizam muita fruta também, especialmente nas cervejas de fermentação espontânea, onde a cerveja é fermenta por leveduras selvagens em tanques abertos, as chamadas Lambic.
As Lambics merecem uma atenção especial, em qualquer parte do mundo se você for visitar uma cervejaria vai encontrar um ambiente extremamente limpo e controlado, com tanques de inox que facilitam a a higienização e controle anti-bacteriano. Já na Bélgica, nas cervejarias que produzem as cervejas Lambics, ficam com as portas e janelas escancaradas, o ambiente é úmido, com mofo nas paredes, insetos, teias de aranha e a cerveja em tanques abertos, só esperando as leveduras selvagens fermentarem o mosto. É uma cerveja selvagem, com muita acidez, um toque amadeirado e vínico. Ganham suavidade quando adicionam frutas como cereja (Krieg) ou framboesa (Framboise) ou ganham características e eferverscência que remetem ao espumante quando recebem a mistura de Lambics com diferentes idades (Gueuze).
É preciso destacar também os mosteiros da ordem trapista onde os monges produzem verdadeiras obras primas como as Tripel, Dubbel, e Quadruppel.



Por fim chegamos na Escola Americana que até pouco tempo era caracterizada pela produção de larga escala, onde as grandes indústrias dominavam, compravam ou quebravam as menores. É a produção da cerveja barata, leve, utilizando milho e arroz para substituir o malte. O estilo é American Light Lager, essa cerveja foi exportada para todo o mundo e foi o estilo adotado no Brasil. Não, a cerveja que o brasileiro toma não é Pilsen, é American Light Lager. Essa foi a pior contribuição do país para o mundo da cerveja.
Mas tudo começou a mudar em 1978 quando o Presidente Jimmi Carter sancionou uma lei que derrubava o veto de produção caseira de cervejas. Nascia assim um movimento cervejeiro que iria revolucionar o país, o movimento batizado de Craft Beer que rompeu todos os paradigmas cervejeiros. Reinventaram e inventam estilos, não se prendem a características do estilo. São ousados e criativos, não existe regras. Mas certamente o que mais caracteriza a Escola Americana são as cervejas extremas, carregadas de lúpulo.
E as American Light Lager?
Bem elas continuam por aí, mas vem amargando uma queda inédita no consumo.
A Budweiser que sempre foi a queridinha dos americanos até década de 90, onde aparecia discretamente e gratuitamente em grandes produções de Hollyhood, chegando a ser considerada patrimônio e simbolo da cultura capitalista dos americanos, foi recentemente ultrapassada em volume pelas cervejas artesanais.
Se podemos classificar os cervejeiros da escola Belga de criativos, o que dizer dos americanos? São criativos, ousados e obstinados por cerveja.
Alguns defendem que não existe uma escola americana, que na verdade eles "apenas" reinventaram estilos. Eu discordo pois eles criaram cervejas com características únicas e o grande trunfo foi desenvolver variedades de lúpulos em solo americano com características bem particulares, extremamente aromáticos e amargos. Eu diria que é o terroir das cervejas americanas.
É fácil identificar uma cerveja com lúpulos americanos.
São vários estilos criados e recriados pelos americanos, mas experimente e se surpreenda com uma Black India Pale Ale (Black IPA) ou se encante com uma American India Pale Ale (APA).

Tudo isso era uma introdução para falar sobre o Estilo Brasileiro de Cerveja, mas o post acabou ficando longo e vamos deixar para outra hora. Vou ir tomar uma cerveja agora, Ein Prosit,



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